Fui ver o filme I Feel Pretty. Podia ser apenas um filme cómico ou uma comédia romântica. Iria sem qualquer preconceito porque sou fã de filmes leves, daqueles só para entreter ao domingo à tarde. Mas já sabia ao que ia, culpa da Maria (vale a pena seguir o blog). Só não imaginei que chorasse. E muito menos que fosse exactamente o filme que precisava de ver neste domingo.
Não vou escrever sobre o filme. Porque gostava mesmo que todas as miúdas que se sentem menos bonitas fossem ao cinema. Mais ainda, como disse uma seguidora no instagram: devia ser obrigatório para todas as meninas.
A beleza é mesmo muito mais que a imagem que tomamos como perfeição, esse lugar onde tudo seria possível e diferente. A beleza é mesmo uma forma de estar na vida.
Cresci com a permanente sensação de que não era tão menina como as minhas amigas. Era assim mais bruta, maior, mais forte, com mais apetite do que “uma menina devia ter”.
Acho que nenhuma adolescente gosta do corpo que tem. É mesmo assim, está nos livros. Eu não fui excepção. Achava-me sempre gorda, apesar de ter 55 quilos para o meu 1,64 metros de altura. Achava que tinha um rabo enorme e ancas larguíssimas. Detestava vestir o 38, enquanto as minhas amigas vestiam o 34. Achava que estava sempre demasiado branca. No Verão, os meus pais não me deixavam estar na praia sem protector solar e eu sempre os culpei por não me possibilitarem um bronzeado decente. Tinha os joelhos cheios de marcas das quedas que dei em menina, quando ainda acreditava que, correndo muito depressa com um guarda-chuva aberto ou mexendo os braços como se nadasse bruços, podia voar. E achava que todos os rapazes iam reparar na minha palidez, nas minhas marcas, nas minhas ancas e nunca nenhum gostaria de mim.
Hoje, a esta distância, sei que estava magra, que o meu rabo é grande, mas não dá para recordes do Guinness, e que vestir o 38 era uma pequena maravilha. Já aprendi que, por muito sol que apanhe – e fiz verdadeiros testes de bronzeamento na transição irresponsável entre as ordens paternais e a liberdade adulta -, nunca serei morena, e que as marcas dos joelhos são bonitas, têm histórias para contar, mas nem se notam com uns collants cor de pele.
retirado do livro Dieta das Princesas
Aos 40, como desabafei no instagram:
Construir o amor próprio de um filho é um dos maiores desafios que levamos na função de pais. E só com 40 anos, e mãe desta miúda, é que percebi que não vale a pena tentar ensinar algo que ainda não temos como conhecimento consistente e consolidado. Que os 40 sejam essa aventura e aprendizagem na construção do amor próprio [que vai tanto para além do corpo ou estamos tão lixadas(os)].
Este filme – I Feel Pretty – é outra forma de dizer isto. Vão ver. Mesmo.
E aquele homem do filme – I Feel Pretty – é o meu Pedro. E ele não viu o filme mas eu vou agradecer-lhe. Mesmo que ele não perceba porquê.
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Obrigada,
Obrigada por tudo o que escreve, obrigada por não nos fazer sentir sozinhas, obrigada por me fazer sentir que há adultas que foram raparigas como eu. Identifico-me imenso com muito do que leio neste diário, também eu fui uma rapariga que me detestei durante anos, que não queria uma roupa nova ou as unhas pintadas ou um cabelo penteado porque achava que não o merecia, que passei a minha adolescência toda “a passar entre os pingos da chuva” para que não reparassem em mim, também adormeci muitas noites lavada em lágrimas porque achava que a minha mãe não gostava de mim porque um dia a ouvi dizer que nunca quiz ter uma filha gorda e não sabia o que me fazer… ainda hoje oiço isso na minha cabeça e sei bem que a minha mãe não o disse por mal e que me adora como sou e tem orgulho em mim. Sempre disse que queria viver sozinha e não ter uma família porque não queria que nenhum filho meu fosse tão infeliz como eu era, hoje não sou infeliz, pode dizer-se que me sai bem na vida: já não sou obesa, consigo correr para o autocarro, tenho um sorriso verdadeiro e expontâneo, tenho o emprego com que sempre sonhei e onde sonhei, comprei uma casa quando todos os meus amigos ainda viviam em casa dos pais, mudei de cidade, namorei, tive paixões infinitas que acabaram, recebo piropos e convites para jantar e beber cafés, enfim… ainda nem 26 anos fiz e já sinto que fiz bem mais que pensava fazer. Neste momento nem tudo é perfeito, em algumas situações ainda fujo das pessoas para que não me magoem, fiquei escaldada quando ouvi uma das minhas supostas melhores amigas do 6º ano dizer que eu era “horrível por ser tão gorda”, ao que lhe responderam: “ela até é bonita, realmente é pena ser assim”. É irónico mas hoje ela veste pelo menos mais 4 números que eu, o que não faz dela uma pessoa horrível, de forma alguma! Porque me apeteceu escrever este testamento? Porque espero que quem o ler leve alguma coisa a minha experiência: apoio se estiverem na mesma situação, ou uma chamada de atenção se estiverem do outro lado, não se esqueçam que os que passam por nós deixam marcas que nos acompanham toda a vida e está nas nossas mãos marcar os outros da forma que queremos 😉 mais uma vez obrigada Catarina e peço desculpa pelo desabafo
É tão verdade! Também eu (provavelmente todas nós, como diz) na adolescência achava que era gorda e que tinha o rabo assim e a barriga assado. Hoje, um pouco mais gorda do que nessa época, com mais barriga, algumas estrias entre outras marcas da vida e ainda com acne (why!?!?!?! :D), consigo apreciar tanto o que é meu. Não é necessáriamente o mais bonito joelho, ou o mais bonito rabo, pé, etc., mas é todo um conjunto no qual me sinto cada vez melhor – não significa que não veja “defeitos” olhando à lupa, claro. O corpo e a mente amadurecem juntos, felizmente! 🙂 se não estávamos lixadas! 😀
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