[os meus medos: ter um emprego normal?]

Há quatro anos, quando estava desempregada e fiquei grávida, decidi que iria tentar trabalhar em casa como freelancer.

Dirão que ficar grávida enquanto estava desempregada foi uma enorme irresponsabilidade. Eu direi que foi uma irresponsabilidade calculada. Sabia a margem que tinha e a rede de segurança com que podia contar. Também sabia que a partir daquele momento não me quereriam num emprego “normal”, realidade que vim a confirmar.

Lembro-me de ligar para o Centro de Emprego a explicar a minha nova condição e a minha preocupação. Responderam-me que continuasse a cumprir o número de entrevistas que o meu “termo de identidade e residência” obrigava e que isso de conseguir mesmo emprego era uma questão secundária.

Face às evidências e à vontade que tinha de ficar com o filho que aí vinha nos primeiros anos e acompanhar mais o meu filho crescido, passei a aceitar trabalhos pontuais ou mais regulares, mais próximos ou mais afastados da minha área, que pudesse compatibilizar com as minhas funções de mãe-a-quase-tempo-inteiro.

Trabalhar a recidos verdes resume-se a uma enorme incerteza. Mas existem algumas certezas: o pagamento mensal à segurança social e a necessidade de estar permanentemente a implorar que nos paguem.

A bem da verdade, também existem privilégios nesta condição: sermos donos do tempo. Posso brincar com os meus filhos, ajudar nos banhos e preparar o jantar, deitá-los com uma história e até adormecer durante dez minutos. Posso trabalhar durante toda a noite enquanto eles dormem e voltar a ser apenas mãe quando eles acordam.

Nos meses em que ninguém responde aos apelos desesperados para que paguem, nos meses em que os trabalhos não aparecem, nos meses em que é preciso ir às poupanças buscar o dinheiro para pagar a segurança social, nesses meses desejo ter um emprego “normal” com um salário certo. Depois tenho medo de perder o tempo que me habituei a ter para os meus filhos e lembro-me de que já não já há empregos certos nem certezas de que o salário seja pago, e as dúvidas voltam todas. Todas menos uma: daqui a uns dias tenho que pagar a segurança social.

5 comentários em “[os meus medos: ter um emprego normal?]”

  1. Passo pelo mesmo dilema, mas do lado de quem trabalha das 9h às 18h (em versão estágio que está a terminar),que gosta do que faz, mas que adorava ter o privilégio de poder trabalhar em casa, gerir o seu tempo e ser mais produtiva.
    A sua escolha, a minha opinião (que vale o que vale), foi a mais acertada. Admiro e esforço e a irreverência que a opção acarreta.

  2. Bem, olha para o lado positivo: tens tempo. Eu estive a recibos verdes e nem isso tinha, porque me obrigavam a cumprir um horário (absurdo, ainda por cima) que nunca tinha sido estipulado em lado nenhum… E sim, compreendo o teu dilema da segurança social. Coragem!

  3. Boa noite
    Queria apenas dizer que a admiro bastante por seguir o seu coração, por não desistir, por acreditar que de facto a vida resolve-se sozinha.
    Acredite que me inspira, que me motiva, o que faz com que não perca a esperança numa mudança de vida, ou melhor, de trabalho. Ao fim de 13 anos já não me identifico com nada que se faça ali e sonho tantas vezes que me despeço. Mas tenho despesas, uma filha (a luz e a alegria da minha vida) e isso condiciona a decisão final.
    Mas não escrevo para me queixar da vida (nem quero)!
    Obrigada pelo seu optimismo.
    Rita

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