[amo-te minha mãe]

Eu gosto do São Martinho. Cheira-me a erva doce e fins de tarde escuros. Entre Outubro e Dezembro o meu pai cozia castanhas todas as noites. Como tudo na vida do meu pai cozer castanhas obedecia a uma rotina rígida [hoje escolheria o adjectivo “deliciosa”]. O meu pai chegava a casa às 17h30. Todos os dias. Duvido que fossem 17H18 ou 17h43. Eram sempre 17h30. Chegava com o saco das castanhas e dava-lhes um golpe perfeito. Uma a uma. Devagar. Ás 19h30 depois do banho tomado e do pijama vestido, o meu pai punha as castanhas a cozer. Lembro-me da panela. Era sempre a mesma. Depois do banho do meu pai a casa cheirava a sabonete e a champô de maça. Depois da água ferver a casa cheirava a erva doce. Para o meu pai a erva-doce curava tudo. Dores de barriga, insónias, dores de cabeça e males de amor. Uma hora depois o meu pai enrolava o tacho das castanhas num pano e punha-as em cima da mesa. O meu pai descascava-me as castanhas.

Ontem, depois do G. tratado, limpo e jantado, deitei-me no sofá com vontade de ceder ao sono-maternal-de-filho-acordado-às-5-da-manhã. Tocaram à porta. Vi a minha mãe subir as escadas com um saco de castanhas na mão. Desculpa, não havia erva doce. E deu-me colo. E descascou-me castanhas assadas. E ofereceu-me um São Martinho.

11 comentários em “[amo-te minha mãe]”

  1. Foi por 'coisas destas' que passei a seguir o teu blogue DEPOIS de comprar o teu livro. E tropecei no teu livro na fnac duas semanas depois do meu pai partir.
    A vida tem destas coisas.
    Grandes mãe, e filha!

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