Declaração prévia: eu não votei Marcelo Rebelo de Sousa
Os resultados das eleições Presidenciais de ontem retratam na perfeição o eleitorado português. As pessoas estão alheadas das decisões políticas. Vê-se na abstenção, o impacto nos números dos muitos que emigraram, aqueles que intencionalmente não votam em tom de revolta (e que, na minha opinião, deveriam optar pelo voto em branco), aqueles que, por desleixo, nem sequer dão importância ao ato de decisão democrática. As pessoas estão cada vez mais afastadas dos partidos. Não interessa a memória política – porque na maioria das pessoas não existe – mas a proximidade que sentem perante os candidatos.
Marcelo Rebelo de Sousa passou os últimos anos a preparar esta vitória à primeira volta (e se era para ganhar de qualquer forma ainda bem que foi à primeira porque poupamos imenso dinheiro). A televisão deu-lhe protagonismo e ele soube usá-lo. Não basta ser comentador e ter tempo de antena. Diariamente passam dezenas de comentadores (e alguns com protagonismo – passado ou presente – na política). Eu já fui vogal na minha Junta de Freguesia, comento regularmente num programa de televisão e não chego a Presidente da República.
Marcelo Rebelo de Sousa percebeu há muito tempo que as pessoas querem ouvir explicações que compreendam, sem palavras caras e com alguma emoção. Assumo: até eu conseguiria gostar de Marcelo Rebelo de Sousa se também não tivesse memória política e não me lembrasse, entre outras, da sua posição face à interrupção voluntária da gravidez. Mas reconheço-lhe o valor. Percebo porque mais de metade das pessoas que decidiram votar o tenham escolhido para Presidente da República. E admiro a capacidade de um discurso conciliador. É um homem inteligente.
É esta mesma proximidade que deu a Vitorino Silva um resultado impressionante. A simplicidade, a falta de filtro, alguma ingenuidade e, lá está, emoção. Depois do 25 de abril, a emoção estava na conquista da democracia. Os partidos tinham sido os protagonistas desta vitória e as pessoas sentiam-se ligadas. Isso perdeu-se. Não lamentemos, faz parte.
Os políticos, no geral, podem aprender com estes resultados. Não vale a pena lamentar a falta de informação e memória, alguma falta de conteúdo e densidade, a excesso de impacto do mediatismo. É preciso chegar às pessoas na realidade que as envolve: falar sem palavras difíceis, usar os meios de comunicação a que as pessoas estão mais habituadas.
Imaginemos um filho adolescente com quem a comunicação está complicada. De que nos servem longos discursos sobre valores e atitudes corretas? De que nos serve ter a razão do nosso lado se o miúdo não nos ouve? Eu prefiro mandar-lhe uma mensagem pelo Facebook, ou o link do Youtube que ele goste através do WhatsApp. Se calhar primeiro falamos de futilidades mas depois, devagarinho, conseguimos conversar sobre o que interessa. Primeiro é preciso chegar às pessoas. O resto recupera-se depois.
Spot on!!
Num espaço de tempo tão curto, vejo-me a comentar outro “post” seu e mais uma vez para concordar a 100% consigo na interpretação dos resultados.
Estive numa mesa de voto e não imagina a alegria que tivemos quando passamos a barreira dos 50% de votantes e chegamos no fim a uns “estonteantes” 53%… Tivemos de ajudar muitas pessoas que por desconhecimento ou falta de interesse não sabiam onde votar, embora se tenha gasto muito dinheiro para se divulgar as várias maneiras de o descobrir.. e um sms faz o trabalho e toda a gente (ou quase toda) tem um telemóvel.
A “malta da política” ainda não percebeu que o tempo mudou e que é preciso primeiro mobilizar as pessoas para o “ir votar” e depois para o resto.
Pode ser que estas eleições sejam um “abrir de olhos” para essa mudança.