[adolescente normal]

Quando tinha 16 anos, como o Martim, ainda achava que podia mudar o mundo. Eu, os meus amigos e colegas de escola que, com a adolescência, transportávamos a coragem, a irreverência, os valores que os nossos pais nos tinham passado e, felizmente e quase sempre, boa educação na forma como tratávamos os adultos. Somos a geração cujos pais foram à Guerra Colonial, fizeram o 25 de Abril, e tinham famílias acabadas de construir quando o FMI esteve cá pela primeira e pela segunda vez.
Quando tinha 16 anos, como o Martim, organizávamos e participávamos em manifestações contra o sistema de educação, contra as portagens, contra novas bombas de gasolina, e outras injustiças várias.
Muitos dos meus amigos, aos 16 anos, trabalhavam nas férias para ajudarem os pais. Eu comecei a trabalhar aos 17 anos, vendi enciclopédias porta a porta, e tive que gastar quase tudo o que ganhei em cabines telefónicas para conseguir que me pagassem.
Quando tínhamos 16 anos, exatamente como o miúdo que se tornou um ídolo nacional, sonhávamos com um emprego com salário fixo, para a vida toda, décimo terceiro e décimo quarto mês, para comprarmos uma casa, um carro e ir de férias para o Algarve ou, quem sabe, para o estrangeiro. Como os nossos pais.
Os empreendedores eram aqueles que queriam continuar o negócio de família, a loja, a fábrica, o gabinete de engenharia ou arquitectura.
Quando tinha 16 anos, não sonhava ter a minha marca de roupa porque estava demasiado fascinada com a possibilidade de comprar aquelas marcas de nome estrangeiro que chegavam a Portugal, ou que a minha mãe me levasse à Baixa e aos Profirios.
Mas, quando tinha 16 anos, e arrisco-me a usar o plural, quando tínhamos 16 anos, se um adulto questionasse aquilo em que acreditávamos, responderíamos com respeito mas coragem, com a força daquilo que defendíamos.
O Martim não é, nem pode ser um símbolo, para o bem e para o mal. Mal deste país se assim for. O Martim é um adolescente normal: acredita no que faz, terá mil e uma incoerências naquilo que defende e respondeu ao adulto que o confrontou. É a ordem natural das coisas: o adolescente tem certezas absolutas, que a vida se encarregará de relativizar, e os adultos servem para furar os balões das ilusões dos adolescentes que já foram.
Se calhar, quando eu tinha 16 anos, perderam-se grandes ídolos de 24 horas, fabricados em redes sociais. Ainda bem.

3 comentários em “[adolescente normal]”

  1. Não conheço bem a história do Martim, mas sei que os adultos nem sempre têm razão… e é pena que não aprendam a aprender com os mais novos… acredito que não seja fácil, mas vou sempre tentar fazer por isso!

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